Imagem de Azagaia: “Um herói para o povo, filho da mãe para os políticos”

Azagaia: “Um herói para o povo, filho da mãe para os políticos”

Imagem de Azagaia: “Um herói para o povo, filho da mãe para os políticos”

Azagaia: “Um herói para o povo, filho da mãe para os políticos”

Ao longo da década de 2000 emergiu, em Moçambique, um cantor bastante popular entre a juventude, com o nome artístico de Azagaia. Azagaia constitui uma lança, utilizada como arma de arremesso, e representou a metáfora para o seu estilo artistico mordaz. O cantor retratou a vida de de uma geração “enteada do poder”, “com gritos de liberdade presos na garganta”, que sobrevive nas periferias das grandes cidades, contrapondo com uma elite sucedida à custa do oportunismo. Azagaia contrastava os competentes, com os obedientes.

Em reacção à Unidade de Intervenção Rápida, Azagaia criou a sua “Música de Intervenção Rápida”, reagindo à violência policial com “um microfone e um par de giradiscos”, com os quais lançava “jactos de palavras, contra jactos de água” ou gás lacrimógéneo.

As revoltas populares contra a carestia do nível de vida, decorridas em 2008 e 2010, inspiraram a música “Povo no Poder”, que veio a constituir o hino de uma oposição alargada ao governo, bem antes das manifestações pós-eleitorais de 2024.

As suas músicas eram frequentemente intercaladas com discursos de Samora Machel, de denúncia ao oportunismo dos servidores públicos ou de edificação de um país assente na igualdade e na dignidade. O ressuscitar do discurso de Samora constituiu um incómodo para uma Frelimo endinheirada, autista e incapaz de promover uma reflexão interna. O cantor denunciava a transformação das elites libertadoras “em combatentess da fortuna”, que enriqueceram à custa do proteccionsimo e da expropriação do Estado, “prostituíndo o socialismo e parindo por acidente um falso capitalismo, filho bastardo do Ocidente”.

Temendo os ventos da primavera árabe, o governo tentou silenciar Azagaia. As suas músicas não passaram nas rádios e televisões públicas e vários espectáculos foram cancelados. A PGR intimou-o a prestar declarações. Apesar de ameaçado e afectado economicamente, Azagaia manteve-se, até ao fim, coerente na abordagem. Faleceu em Março de 2023, faz agora dois anos. No cortejo fúnebre, milhares de jovens foram repelidos com gás lacrimogéneo, ajudando a reforçar o carisma do cantor entre a juventude: “Um Herói para o povo, filho da mãe para os políticos”.

Azagaia prestou um importante serviço público. Denunciando as manipulações políticas alertou os mais jovens para as “mentiras da verdade”. Ensinou a uma juventude privada de um sistema de ensino de qualidade, que “as ideias dominantes constituem, afinal, as ideias das classes dominantes”. Melhor que muitos professores, explicou as contradições do sistema de relações sociais. Como diria o sociólogo americano Write Mills, “os sociólogos fazem maus romances, Mas os romancistas fazem boa sociologia”.