Na semana passada, o Expresso das Ilhas publicou uma reportagem surpreendentemente sincera para os padrões do jornalismo local: o texto debruça-se sobre o dinamismo económico periódico que resulta das campanhas eleitorais; e foca as motivações essencialmente comerciais do frenesi que parece possuir os supostos militantes de cada partido.
Durante as campanhas, cada candidatura
• remunera os chamados ativistas por operações porta a porta e para encher os recintos dos comícios;
• arrenda imóveis em múltiplos bairros para coordenar as atividades de forma directa;
• Aluga carros de som, equipamentos de palco, e demais serviços de produção;
• E emprega artistas, um dos atrativos principais dos comícios-festa.
Em maior ou menor grau, toda a campanha política gera transações avultadas de bens e serviços. A recente campanha de Kamala Harris, por exemplo gastou mais de um bilhão de dólares em bens, serviços e salários – e ainda ficou a dever 20 milhões.
Nos Estados Unidos, um bilhão de dólares é uma quantia importante; ainda assim, é uma gota no oceano da economia americana. Mas numa economia depauperada como a Cabo-verdiana, a condição generalizada do eleitorado é o desemprego e o sub-emprego. E a perspectiva de uma ocupação sazonal razoavelmente remunerada é altamente aliciante.
Para além disso, a proximidade do poder político conseguida durante a campanha poderá, eventualmente, conduzir, em caso de vitória, a um emprego mais permanente. Na economia Cabo-verdiana, isso é água no deserto
Mas não é apenas a ativista que recebe mil e quinhentos escudos por dia – e a quem foi prometido um posto de assistente administrativa na Câmara Municipal – que conta com ganhos na economia de campanha.
A classe técnica e executiva também aposta fortemente nas campanhas eleitorais, como um investimento na carreira profissional. A diferença é que, enquanto a ativista de bairro é paga diariamente com os fundos da campanha, os que ambicionam chefias pretendem ser pagos posteriormente com salários chorudos financiados pelos recursos do Estado.
O exemplo mais ilustrativo desta tendência nefasta é o tamanho inexplicável do atual governo. Nas legislativas de 2016, A candidatura vencedora do MpD proclamou a sua intenção de apresentar um governo enxuto, de acordo com a pequena dimensão do país e da sua população.
Contudo, Ulisses Correia e Silva foi aumentando o tamanho do seu executivo ao longo do primeiro mandato. Quando ganhou um segundo mandato em 2021, apresentou um executivo com uma dimensão absolutamente irracional: 28 governantes para quinhentos mil habitantes.
Numa economia improdutiva é expectável que cidadãos, de alto a baixo da cadeia alimentar, contem com a participação política para garantir ou suplementar os seus rendimentos. O problema é que, num universo em que todos fazem política por comércio, a política tornar-se-á cada vez menos capaz de cumprir a sua missão – que é governar pelo bem do colectivo.