A ajuda humanitária em Cabo Delgado vem apresentando desafios crescentes. A insegurança continua a afectar o Nordeste da província, com impacto sobre a assistência humanitária.
Os ciclones Chido, Dikeledi e Jude, que afectaram o Norte de Moçambique, revelaram a vulnerabilidade das infraestruturas perante eventos climáticos extremos. Até ao final de 2024, quase 600.000 pessoas haviam sido deslocadas em resultado do conflito armado e de desastres naturais. A destruição de pontes impediu a transitabilidade durante várias semanas. Da mesma forma, os conflitos pós-eleitorais, interromperam a circulação rodoviária, complicando a acção de organizações humanitárias e afectando a distribuição de medicamentos.
No início do ano, a polícia interrompeu a distribuição de kits de dignidade no bairro de Paquitiquete, pelo facto de conterem apitos. Apesar de ser distribuído por muitas organizações humanitárias com o objectivo de alertar para assaltos e violações de mulheres, a verdade é que os apitos passaram a ser associados às manifestações, criando incómodo nas autoridades.
Apesar destas necessidades crescentes, o financiamento à ajuda humanitária caiu drasticamente. O Plano de Resposta Humanitária de 2024 teve apenas 41% de financiamento, o seu nível mais baixo de sempre, sendo que a assistência alimentar cobre apenas 13% das necessidades da província. A cobertura mediática limitada, agravada por crises globais concorrentes, desviou a atenção e os recursos de Moçambique. Acrescem os impactos da saída da USAID e paralisação de muitas actividades, incluindo aquelas relacionadas com a prevenção e tratamento do HIV. Pela primeira vez em muitos anos, Moçambique torna-se um dos países internacionalmente mais negligenciados pela ajuda humanitária global.
Todo este contexto afecta os trabalhadores de ONGs e das Nações Unidas, que enfrentam riscos acrescidos. As populações questionam a escassez da ajuda, mas também os mecanismos que entendem como desiguais e incapazes de responder a todas as necessidades. Cresce a convicção que os técnicos das ONGs melhoram apenas as suas vidas, à custa da desgraça da população. Nos últimos meses aconteceram vários assaltos a missões da ajuda humanitária. A assistência concentra-se nas áreas controladas pelo governo de Moçambique e apresenta receio de actuação nas áreas onde a insurgência tem maior contacto com a população, comprometendo a respectiva neutralidade, tornando-se um alvo dos rebeldes. Por parte dos profissionais no terreno existe uma percepção de incerteza e um receio de agravamento da situação a qualquer momento.