Em 2010, quando a minha então instituição, sediada na Praia, negociava um investimento como uma empresa islandesa, o seu boss pediu-me para visitar o tribunal local. Tínhamos definido que a justiça cabo-verdiana seria o árbitro entre as partes e ele queria saber com que qualidade de justiça a contar.
Perguntei se queria marcar uma reunião com algum responsável, ele disse que não, pretendia apenas avaliar o Estado do edifício. Através desse único fator, perceberia o nível de prioridade que a justiça representa para o Estado.
Desde então, adotei este critério para avaliar o universo institucionais. O empresário islandês ficou satisfeito com sua inspeção patrimonial. No entanto, de uma perspetiva patrimonial, o Estado cabo-verdiano expõe claramente as prioridades questionáveis da governação.
Um exemplo ilustrativo são as escolas coloniais, edifícios amplos, harmoniosos e adequados ao clima tropical, expropriados aos alunos para alojar a nova aristocracia cabo-verdiana, os burocratas. A burocracia cabo-verdiana está regimente instalada em edifícios novos ou coloniais renovados, com a canalização de primeira, mobiliário reluzente e climatização.
Enquanto isso, as crianças foram despachadas para edifícios mal concebidos, mal construídos e precocemente degradados, demonstrando a verdadeira importância atribuída à educação em Cabo Verde.
Estou na Guiné-Bissau. Aqui, os serviços do Estado funcionam maioritariamente em edifícios degradados, tinta descascada, bolor nas paredes, mobiliário ultrapassado e jardins abandonados.
Os edifícios institucionais mais bem conservados pertencem em regra a instituições estrangeiras ou ONG e são mantidos com capitais externos, mas há exceções, nomeadamente a Presidência da República e o Ministério do Interior.
A degradação patrimonial dos serviços do Estado versus o ótimo Estado do Palácio Presidencial e da Tutela Policial, evidencia as prioridades da governação e para onde são canalizados os parcos capitais públicos suplementados certamente por outros fones de rendimento.
A diferença entre a Guiné e Cabo Verde é que na Guiné esta disfunção institucional afeta apenas os índices de desenvolvimento humano. A população depende economicamente do setor agrário que é funcional, do comércio tradicional e infelizmente de uma economia de narcóticos que vem preencher um vácuo na oferta de emprego formal.
Em Cabo Verde, a sobrevivência do Estado depende inteiramente da captação de ajuda internacional. São as instituições públicas que recolhem e redistribuem essa ajuda crucial para manter os equilíbrios sociais. Além disso, a expansão institucional permita ao Estado continuar a absorver mão-dobra em condições atrativas num país onde o desemprego é estrutural.
Em terceiro lugar, contrariamente à Guiné-Bissau, décadas de funcionalidade institucional criaram expectativas altas entre a população, que seria politicamente arriscado de fraudar. Naturalmente, o conforto da classe administrativa tem prioridade sobre a missão da instituição, mas o imperativo da funcionalidade revela-se no bom estado dos nossos edifícios institucionais.