Re)imaginar a Guiné-Bissau através da expertise Diplomática de Amílcar Cabral constitui a urgência de invocar a memória coletiva de uma nação forjada na luta. Pois, é nesse pendor da consciência histórica, que o país, pelos exemplos da construção das nações livres se compromete, sem deixar se levar aos obscurantismos, imaginar o seu presente, revelar a semente que manifesta constantemente no imaginário guineense. O dilema a que se prende a Guiné-Bissau, requer vencer a amnésia sobre expertise Diplomática de Amílcar Cabral, por isso a necessidade de celebrar/trazer o significado do Iº discurso de Amílcar Cabral na ONU.
Num mundo complexo, caraterizado por maniqueísmo político e diplomático que grassava o mundo pós II guerra mundial, em que muitos povos, animados pela ideia da liberdade (independência política) e emancipação política, muitas lideranças se destacaram por defender com clareza e coragem a ideia da independência total dos povos. Dentre estes líderes, destacou-se a figura de Amílcar Cabral– defensor fiel das independências africanas, nomeadamente da Guiné-Bissau e Cabo-Verde (e das causas mais nobre da ONU), e, com forte e significativa apoio para as causas das independências de Angola, Moçambique e São Tomé Príncipe, fundando a CONCP- Conferencias das Organizações Nacionalistas das Colónias Portuguesas e FRAIN-. Frente Revolucionária Africana para Independência Nacional das Colonias Portuguesas.
Colocar termo fim ao colonialismo e fascismo português, construir nações livres e povos independentes, permitir que, marchando com os próprios pés, a construção duma nova, coesa e forte sociedade, que se possa realizar e viver o seu velho e antigo sonho de séculos- liberdade.
Aliás, dizia Amílcar Cabral,
“O que quer o povo africano é ter e citamos, a sua própria expressão política e social, mas nós chamamos isso a independência, quer dizer, a soberania total do povo, no plano nacional e internacional, para construir ele mesmo, na paz e na dignidade, a custo do seu próprio esforço e sacrifico, marchando com os próprios pés, guiados pela própria cabeça, o progresso a que têm direito, como todo os outros povos do mundo”. (trecho do discurso de final do ano, 1973)
Com o objetivo claro e compreendendo a necessidade de desencadear uma ofensiva diplomática e estratégica, Cabral percorreu o mundo, conversou com tendências políticas e ideológicas (NATO e Varsóvia), Instituições Globais, Atores e Movimentos Progressistas, privou com Olov Palme (famoso primeiro ministro sueco), Senghor (Primeiro presidente do Senegal), Basil Davinson (o Socialista e Progressista), com Jeane Martin Cissé (importante Diplomata da Republica da Guinee), Papa Paulo VI, com Fidel Castro, Ahmed Sékou Touré, e, por fim, ao mais alto nível, no dia 12/12/1962, fez chegar à tribuna das Nações Unidas à voz dos povos da Guiné-Bissau, na IV Comissão da ONU, encarregada para discutir a questão do direito da autodeterminação dos povos.
Volvidos 61 anos, decidimos recuperar o histórico discurso de Amílcar Cabral na ONU, para a partir do mesmo, pensar em como se pode (re) imaginar uma nova Guiné-Bissau através duma Diplomacia consistente e responsável. Não obstante os tempos conturbados, a Guiné-Bissau continua a ser portadora de um legado Diplomático valioso, o que temos feito desse legado já é um outro debate. Deve-se recordar, sempre, que a Guiné-Bissau é um exemplo de como uma Diplomacia séria e responsável pode fazer nascer um país mesmo em contexto de muita complexidade ideológica. Pois bem, ainda que os tempos e ventos são turvos, é preciso as vezes lembrar.
Por último, ficam estas questões?
Como a engenharia Diplomática engendrada por Amílcar Cabral pode servir-nos duma espécie de Soft power, no processo de relançamento da Diplomacia guineense?
O que fazer com toda experiência, legado Político e Diplomático de Amílcar Cabral?
Por último, quem (ou grupo) será portador e continuador duma deriva Diplomática que não precisava se apresentar?
Carlos Lopes tem razão quando afirma de que, na Diplomacia Internacional, o que conta mais do que tudo, é a construção de confiança. Parece óbvio, para que a Guiné-Bissau volte a ser aquele país que foi no limiar da independência, o mundo precisa voltar a ter confiar na Guiné-Bissau, mas, como fazer isso? Parece que não há tantas voltas a dar, vai ser preciso voltar ao Cabral, em concreto, a sua dinâmica e modus faciendi Diplomático, adaptando as novas dinâmicas e realidade da atualidade. Aliás, isto era Cabral- adaptar as ações, decisões às realidades concretas.
Em suma, foi graças ao seu prestígio e expertise diplomática, que construiu a tal de confiança diplomática, senão, perguntamos:
– Que Estado ou nação no mundo, credenciou os Embaixadores horas após a proclamação do Estado? Obs.: Ainda nas matas, no caso, em Boé.
Ps. De seguida, logo de imediato, mais de 70 países reconheceram à independência da Guiné-Bissau.
Isto é mais do que a demonstração de confiança Diplomática. Isto é Cabral.