Na semana passada, Paulo Veiga – líder parlamentar do MpD, o partido que suporta o Governo – anunciou a sua demissão da direcção da bancada.
Surgiram logo rumores que a causa directa da saída de Veiga seria a emissão, com o aval do Governo, de um selo comemorativo do centenário de Amílcar Cabral.
Os cabralistas mais inocentes da nossa sociedade civil caíram de cabeça nesta hipótese, lamentando teatralmente a suposta sanha raivosa e invejosa que o MpD dirige à memória de Cabral.
Mas a verdade é que as corporações políticas Cabo-verdianas não adotam posições ideológicas – apenas eleitorais.
Efectivamente, Paulo Veiga negou a hipótese do selo, afirmando que a questão fundamental é a falta de articulação entre o Executivo e a direcção do Grupo Parlamentar.
Ou seja, a demissão de Veiga estará ligada a interesses políticos – não a impulsos ético-ideológicos. E o mais provável é que seja o prenúncio de uma batalha pela liderança do partido.
Paulo Veiga assumiu a liderança da bancada do MpD em Setembro de 2022, na sequência do seu pedido de demissão do cargo de Ministro do Mar, que exercia desde 2020.
Na época, muito se especulou sobre a sua saída do Governo. A opinião prevalente é que em 2021, enquanto director da campanha presidencial de Carlos Veiga, seu primo em primeiro grau, Paulo Veiga sentiu que o governo tinha traído o seu candidato, facilitando a vitória de José Maria neves.
Independentemente da causa, o facto é que, após a sua saída do Governo, Paulo Veiga reintegrou rapidamente o centro decisório do partido, numa posição poderosa e visível: a de líder parlamentar.
Isto indica que, apesar da derrota de Carlos Veiga nas ultimas presidenciais, a chamada ala Veiguista continua dominante no MpD.
Esta facção é composta por vários grupos de interesses que convergem em torno da marca Veiga – e domina um importante bloco de suporte financeiro e eleitoral.
Para além de representar poderosos interesses políticos e empresariais, Paulo Veiga já construiu um percurso político pessoal, como governante e parlamentar. Ademais, é dono de uma postura cordial, mas discreta – que contrasta positivamente com a vulgaridade e o narcisismo rompantes na cúpula do partido.
Em 2026 teremos eleições legislativas. Ao longo dos últimos oito anos, o MpD liderado por Ulisses Correia e Silva esgotou a totalidade da confiança popular conquistada em 2016. Portanto, é natural que surja uma competição séria pela liderança do partido; e é natural que ela surja numa ala com raízes fortes na corporação.
Se as intenções de Veiga sobre a liderança do MpD se confirmarem, representarão um sério desafio para Ulisses Correia e Silva e o seu círculo antes das próximas legislativas.