Em Setembro de 2022, o capitão Ibrahim Traoré liderou um golpe militar que o instalou como Presidente do Burkina Faso. O golpe foi popularmente aclamado devido à insatisfação da população com o desempenho dos seus predecessores, tanto eleitos como militares.
Desde a sua ascensão, Traoré tomou um conjunto de decisões mediáticas, particularmente uma aproximação à Rússia e a denúncia de um conjunto de acordos draconianos entre o seu país e a França.
As relações neocolonialistas que os Estados africanos mantêm com o Ocidente produzem uma revolta crescente nas suas populações empobrecidas e nas suas diásporas marginalizadas.
A audácia política e ideológica de Traoré, ao desafiar um status quo injusto, transformou-o rapidamente num fenómeno popular, inclusive em Cabo Verde.
O terreno político generalizado na África pós-colonial não favoreceu o amadurecimento dos eleitores. Ao invés de forçarem os seus dirigentes a criar instituições sólidas e representativas, os eleitores africanos demonstram sistematicamente uma propensão para se deixarem seduzir por individualidades carismáticas — como Traoré.
Por um lado, a maioria dos líderes democraticamente eleitos em algumas das mais bem cotadas democracias africanas — tal como a nossa — revelou-se incapaz de governar com eficácia. Enquanto isso, ditadores como Muammar Gaddafi e Paul Kagame melhoraram significativamente o nível de vida das populações.
Por outro lado, a maioria das personalidades carismáticas, que chegaram ao poder por métodos extra-democráticos, não produzem qualquer melhoria; e acabam por se eternizar em governos altamente destrutivos.
No que respeita a Ibrahim Traoré, o seu curto percurso já revela alguns indícios preocupantes — como o seu adiamento sistemático do regresso a um governo representativo.
Em 2023, Traoré comprometeu-se a realizar eleições democráticas em Julho de 2024; mas retrocedeu, alegando estado de emergência. Meses mais tarde, conseguiu o alargamento do seu mandato por mais cinco anos. Finalmente, em Dezembro de 2024, removeu o primeiro-ministro e dissolveu o governo, transformando o Burkina Faso efectivamente no seu one-man show.
A simbologia militar ostentada teatralmente por Traoré também deveria levantar preocupações. Traoré apresenta-se em eventos diplomáticos trajado como se estivesse em combate activo, numa tentativa evidente de se representar como herói militar e de se ligar à memória de Thomas Sankara, o célebre líder reformista burquinabe, assassinado em 1987.
Tal como Sankara, Traoré é jovem, pan-africanista e de pendor marxista; e exagera com mão pesada cada um destes atributos, buscando maximizar o benefício da sua conexão fabricada com Sankara.
É possível que Traoré se revele o homem necessário para o momento — um líder capaz de romper as amarras que mantêm os Estados pós-coloniais africanos presos ao Ocidente. Mas também é possível que se eternize no poder, em detrimento do povo burquinabe.
Enquanto africanos, não podemos contar com a auto-regulação de líderes como Traoré. A ÚNICA dinâmica que nos trará estabilidade é a nossa capacidade, enquanto cidadãos, de regular os nossos dirigentes; de limitá-los e forçá-los a um contrato social que proteja os nossos interesses enquanto cidadãos.