Não obstante a diminuição da violência pós-eleitoral, o debate político continua inflamado em Moçambique. Nas ruas ou nas redes sociais, vozes iradas continuam a culpar a Frelimo por todos os problemas de governação. Em contrapartida, alguns críticos de Venâncio Mondlane associam o líder da oposição ao populismo de direita, a a Bolsonaro ou a Trump. Venâncio não esconde a sua admiração por Bolsonaro e ambos têm relações próximas com a Igreja. Exímio comunicador, Mondlane repete com frequência a necessidade de derrubar o establishment. Se é verdade que Venâncio capitaliza de forma populista a insatisfação geral em relação à pobreza e falta de oportunidades, explorando habilmente o problema da corrupção, também é verdade que este fenómeno é mais complexo.
Em primeiro lugar porque o populismo sempre foi a tónica dominante do poder central em Moçambique. O Estado colonial explorou habilmente a ignorância da população, apresentando a sua missão civilizacional como forma de legitimação, atemorizando os africanos contra atitude malévolas de comunistas russos ou chineses. A Frelimo manteve a tónica populista, recuperando o mito dos 500 anos, desta vez para salientar a resistência anti-colonial. Repete que as escolas e hospitais foram construídos pela Frelimo e, mais uma vez, desmoçambicaniza o protesto. Todo o conflito social (da Renamo à insurgência em Cabo Delgado) é invariavelmente explicado por interferência da mão-externa, ignorando as contradições históricas exsitentes na sociedade moçambicana, que ajuda a reproduzir.
Venâncio Mondlane partilha nas redes sociais as suas intervenções onde denuncia a corrupção e o despesismo governamental. Critica a violência do Estado sobre a população e, no final, conforta os manifestantes feridos pela polícia. Denuncia a partidarização da justiça, ao mesmo tempo que se entrega à PGR, produzindo um mártir para a população. Inspirando-se na religião apresenta-se como um líder messiânico, que transporta o seu povo pelo mar vermelho rumo ao paraíso. Não tendo mais nada para oferecer, oferece ao povo aquilo que ele está mais carenciado, de esperança, num cenário de anomia social generalizada. Empolgados, os apoiantes de Mondlane exaltam o seu líder e mostram-se crescentemente intolerantes em relação a apoiantes governamentais, gritando “Avahivhe” (ladrões) ou Anamalala (chega, vão-se embora).
Num cenário de exclusão social endémica, os líderes que demonstraram mais sucesso, de Samora Machel a Afonso Dhlakama, repetiram a mesma fórmula populista e agressiva no discurso. O populismo de Venâncio Mondlane e os discursos violentos dos seus apoiantes constituem, na verdade, uma reacção e, simultaneamente, uma extensão do populismo e da intolerância da Frelimo, que já havia assumido a mesma atitude em relação ao poder fascista colonial.