As eleições americanas serão hoje; e o embate é sempre seguido com interesse pelos Cabo-verdianos. Naturalmente: a nossa emigração para os estados unidos é centenária e a comunidade lá residente é apreciável.
Pelos democratas, a candidata é Kamala Harris: uma política de ascendência mista crioula e asiática, parecida com uma cabo-verdiana, supostamente progressista e amiga da emigração.
Pelos republicanos, temos Donald Trump: um velho milionário branco, arrogante, racista e narcisista.
A imagem de marca projectada há muito pelos democratas é de aliados da classe trabalhadora e das minorias étnicas e identitárias, contra candidatos conservadores que os querem sufocar.
A imagem e a oratória são elementos determinantes desde os primórdios da política; mas num mundo dominado pelos media e pelas redes sociais, tornaram-se determinantes quase exclusivos das escolhas de grande parte do eleitorado.
Contemporaneamente, pelo mundo inteiro, a política reduz-se grandemente à eficácia da imagem projectada pelos candidatos sobre um público fútil, que deseja ver-se ao espelho.
No entanto, a política não deve ser um espelho; deve ser uma ferramenta, que utilizamos para eleger os indivíduos e as organizações que melhor representam os nossos interesses económicos e sociais.
Quando Barack Obama venceu as eleições presidenciais americanas em 2008, a população negra celebrou a sua vitória como uma vitoria étnica; e o pais inteiro celebrou-a como uma vitória sobre um passado vergonhoso de violência racial.
Mas quais foram os resultados práticos da eleição de um presidente negro para o cidadão negro americano? Ou as vantagens da eleição de um democrata para a classe trabalhadora depauperada?
Infelizmente, na crise de financeira de 2008, Obama comprovou que era tão fiel aos bilionários seus financiadores quanto qualquer candidato Republicano.
Assim como Harris está a comprovar que a sua aprovação da conduta genocida de Israel em Gaza equivale ao posicionamento da extrema direita de Trump, com quem partilha a mesma classe de financiadores.
Ou seja, a mais valia que candidatos como Obama e Harris oferecem aos seus eleitores e apoiantes é essencialmente identitária.
A diáspora cabo-verdiana residente nos estados Unidos talvez ainda tenha motivos concretos para torcer por Harris, nomeadamente as expectativas perturbadoras sobre as políticas de imigração de Trump.
Mas para os torcedores de Harris aqui no país, o motivo fundamental é a simples emoção de ver uma mulher negra liderar a maior potência mundial. Nada, para além dessa satisfação identitária duvidosa.
Deveríamos estar cientes que, Para nós, na periferia global, uma vitoria de Kamala Harris Significará apenas, ao que tudo indica, a continuidade da vergonhosa prepotência geopolítica dos Estados Unidos.