O jornalismo angolano vive uma semana muito difícil. Tudo começou na segunda-feira com a tomada de posse de Manuel Pereira da Silva, o novo presidente da Comissão Nacional Eleitoral.
Manuel Pereira da Silva não é novo presidente, vai ter um novo mandato, foi reconduzido no cargo. Porque foi Manuel Pereira da Silva que, por exemplo, organizou as eleições de 2022, eleições muito contestadas. A ata dos resultados não foi assinada pelos deputados da oposição, apenas foi assinada por Manico [Manuel Pereira da Silva] e pelos comissários que representam o MPLA na Comissão Nacional Eleitoral. Portanto, o desempenho de Manuel Pereira da Silva não tem sido, propriamente, muito elogiado.
E, em protesto contra a tomada de posse, a Unita decidiu abandonar o parlamento no momento da tomada de posse. Pois bem, esse abandono foi completamente ignorado pela comunicação social pública. Não deram, ignoraram, sobretudo nas televisões, nos noticiários, ignoraram completamente a saída dos deputados da Unita do hemiciclo.
Entretanto, também está em discussão na mesma Assembleia Nacional um pacote sobre eleições em que há propostas do MPLA e há propostas da Unita no sentido de alterar a lei eleitoral e outros registros, etc. O pacote eleitoral está a ser alterado. Pois bem, a comunicação social pública também tem ignorado completamente as propostas da Unita e só dá tempo de antena ao MPLA.
Fazem-se debates e entrevistas nos principais telejornais em que não está nenhum elemento da Unita, só estão elementos do MPLA a falar de um assunto em que ambos têm propostas na Assembleia Nacional.
Todos sabemos que a comunicação social pública tem, todo o jornalismo deve ser independente e deve ser bem feito, mas se há algum que tem um dever especial é o jornalismo público, é o jornalismo praticado pelos órgãos públicos, porque são pagos pelo dinheiro dos contribuintes.
Aqui em Angola, acresce que os órgãos públicos são os únicos que chegam a todo o território nacional, as televisões existentes são todas públicas, a única rádio que tem verdadeiramente cobertura nacional é a Rádio Nacional de Angola, o único jornal diário impresso é também público.
E são esses órgãos públicos que dão um tratamento privilegiado ao MPLA e ao governo e ignoram completamente tudo aquilo que a oposição faz. E o problema é que ninguém consegue fazer nada contra isso. Há uma ação popular entregue no Tribunal Supremo que não tem resposta, a ERCA, que é a entidade reguladora, também não funciona.
Estamos numa situação em que ninguém sabe o que é que pode fazer relativamente a esta situação, mas que ela é muito triste, ninguém tem dúvidas nenhumas sobre isso. Mas vigora aqui a lei do quero, posso e mando, o MPLA quer, pode e manda e faz dos órgãos de comunicação social públicos como se fossem os seus órgãos partidários.