No seu livro A luta pela independência. “A formação das elites fundadoras de FRELIMO, MPLA e PAIGC”, a já falecida intelectual portuguesa, Dalila Cabrita faz uma radiografia do processo que conduziu as independências dos países que foram dominados pelo Portugal colonial.
Com maior enfase e foco no PAIGC, através do seu líder, Amílcar Cabral, Cabrita enalteceu os feitos diplomáticos que Cabral obteve e assim como momentos complicados no que toca relações e contatos, buscando convencer os parceiros e aliados sobre a causa guineense.
No livro, chamou a minha intenção a dificuldade que Cabral teve com Senegal, aliás, da forma como Senegal, através Senghor dificultou muito Cabral em buscar e ter a solidariedade da OUA em reconhecer o PAIGC de Cabral enquanto o único e legitimo representante do povo guineense no contexto da luta de libertação nacional.
A OUA comportava o chamado clube dos 9, os nove estados membros da OUA que decidiam sobre questões das lutas libertarias, onde Senegal fazia parte. Não obstante o êxito que obteve Cabral, os primeiros momentos foram bastantes difíceis, Cabral reconhecia as barreiras que a diplomacia senegalesa lhe impunha.
Esta questão fica mais clara e evidente no livro publicado pela Ed. Rosa de Porcelana da Ana Maria Cabral, um conjunto de cartas escritas por Amílcar Cabral a sua esposa, dentre as cartas, há uma chama atenção para aquilo que foi, tem sido e talvez será a relação de Guiné-Bissau com Senegal.
Após uma conferência internacional, Cabral escreve a esposa, dentre tantas coisas ditas, destacou o fato de não compreender porque razão “os nossos frèrès de Senegal” dificultavam sempre a nossa posição. Dava assim para entender, que ainda nessa altura, Senegal já constituía alguma preocupação para diplomacia de estado que estava para nascer.
Esta breve alusão histórica, talvez nos permite problematizar um pouco o significo político de Dakar nas dinâmicas socio política de Guiné-Bissau. Por que razão Senegal praticamente nunca teve uma posição clara sobre Guiné-Bissau?
Vejamos os últimos acontecimentos, ficou claro e patente a cumplicidade do presidente Bassirou Faye com regime “deposto” de Umaro Sissoco Embalo.
Fonte anonimas contaram que após ser confrontado sobre a guarida que deu ao USE sem conhecimento do governo, sabe-se que assumiu que a viagem foi custeada por ele, ou seja, foi ele quem custeou tudo. Mas ainda assim, não parece ser uma boa explicação. A mesma fonte confirma que foi o presidente senegalês que desmantelou a decisão que saiu da primeira concertação dos chefes do Estado da CEDEAO em que foi acordado que deslocariam a Bissau vários presidentes, dentre os quais ele e José Mária Neves de Cabo-Verde, para tratar com urgência a situação em Bissau, no final acabou por se deslocar apenas o presidente de Serra Leo, que presidia a organização.
Ainda mais, durante a última cimeira, todas as informações obtidas dão conta de que presidente Senegalês não teve um posicionamento claro e definido sobre a situação guineense. Não deve parecer no todo coincidência.
Eventos históricos recentes: visita de USE a Dakar logo após se autoproclamar presidente em 2019, Macky Sall usou o seu twitter para felicitá-lo, mesmo sabendo que tramitava no supremo um contencioso eleitoral, posso mencionar reunião de Nuno Nabian e Umaro Embalo para selar o acordo político durante a segunda volta da eleição presidencial de 2019, dentre vários eventos que podíamos aqui citar, diretamente ligados a Dakar sobre a situação na Guiné-Bissau.
Senegal não deixa de ter peso na vida política guineense e contará ainda muito, enquanto a Guiné-Bissau não encontrar um grupo e elite política consciente do seu papel e desafio.
Recente visita relâmpago do ministro dos negócios estrangeiro de Senegal e de defesa na sequência duma missão militar do alto nível abortada sem grandes explicações, é um outro exemplo desta relação e posição nada clara que carateriza as relações entre Senegal e Guiné-Bissau.
Cabral conseguiu driblar Senghor, para usar a expressão da investigadora Cabrita, pois sabia os problemas e tinha uma agenda clara, pós-Cabral não se deu continuidade a tradição duma “Diplomacia Responsável” como costumo dizer.
Uma Diplomacia que teve duas fases fundamentais: a da mobilização e no processo das negociações finais, pós-independência que deveria ser a fase da coroação da diplomacia guineense, infelizmente, foi o inicio do desmoronamento duma diplomacia que um dia o mundo aprendeu a respeitar.
Nos últimos tempos e hoje, ficou uma diplomacia insignificante, Diplomacia de mera formalidade, sem expressão alguma.
Senegal tem que ser estudado e compreendido, tem de haver um modo político e diplomático da Diplomacia guineense de se olhar para Senegal- O que é Senegal para Guiné-Bissau (Dacar) e vice-versa?
Compreender além das especulações, interesses, com base no estudo e dados concretos- significado de Dakar na realidade política guineense.