Em Moçambique, a crise política e eleitoral em que nos encontramos, exige que reflitamos sobre as razões na base dos protestos que têm sacudido o país. Os protestos têm sido mais intensos em Maputo, a capital de Moçambique, e a resposta das forças de defesa e segurança também tem sido violenta. Há várias mortes a registar e inúmeros feridos, e a agitação continua a marcar o panorama político.
Há várias razões para esta onda de protestos. Desde logo uma crise de confiança generalizada, sobretudo entre os mais jovens, que são a maioria da população, em relação às instituições políticas e ao seu futuro, futuro este prometido, mas não comprido.
A mobilização destes jovens significa que há linhas vermelhas que foram tocadas – os assuntos políticos e económicos que não são negociáveis. A resposta, a meu ver, não é pela violência, sem programa político que mova estas manifestações. É fundamental que conheçamos o caderno reivindicativo que move os manifestantes, com recados políticos claros e mobilizadores, que ajudem a organizar o protesto e a preparar as negociações.
O que as manifestações revelam é que há desagravo, e que este desagravo tem de ser estudado, num contexto em que a população jovem, letrada, com acesso a telefones móveis, perdeu a confiança nas instituições políticas que não conseguem encontrar respostas às suas aspirações sociais e económicas.
O atraso na divulgação dos resultados eleitorais e as discrepâncias nos resultados que já foram detetadas contribui para reforçar a perceção de que a transparência e a eficiência são frágeis, e que o sistema político não está sintonizado para responder aos problemas que a maioria dos moçambicanos enfrenta. Sobretudo é óbvio como, ao longos da última década, o Estado desinvestiu na qualidade das politicas públicas, não sendo capaz de garantir justiça social aos moçambicanos e moçambicanas.
Dados do Inquérito ao Orçamento Familiar de Moçambique, realizado em 2019/20, indicavam 47% das mulheres e 39% dos homens com idades entre os 20 e os 24 anos não têm emprego, educação ou formação específica. O flagelo do desemprego, para muitos jovens que acabam o ensino secundário e muitos mesmo o ensino técnico ou superior mostra que as políticas públicas não têm sido eficazes em abordar esta questão.
O declínio na educação e da saúde de qualidade, são outros dos problemas que marcam a nossa realidade. Em vez de se sentirem representados, os jovens moçambicanos não se identificam com muitos dos candidatos a postos de eleição, pois as promessas de prosperidade continuam a ser adiadas, tendo o desemprego e a pobreza aumentado na última década, fruto das políticas neoliberais promovidas pelo governo. Novas estratégias para combater a pobreza e o desemprego são urgentes.
Em segundo lugar, o governo que se seguir terá como uma das principais tarefas precisa de unir o país, que dividido com a escalada da disputa entre o candidato presidencial Venâncio Mondlane e o candidato do partido Frelimo. Finalmente, o cancro da corrupção, que se intensificou nos últimos anos. As instituições destinadas a garantir a transparência e a responsabilização têm sido ou silenciadas ou ineficazes. É fundamental restaurar a confiança e a credibilidade no governo e nas suas instituições, incluindo o poder judicial.
Para tal, é necessário renovar as instituições que asseguram a transparência e a responsabilização do governo, e acabar com a cultura da corrupção. Estes desafios não encontrarão soluções imediatas, mas ter um governo que dialoga com os cidadãos é um passo fundamental para recrear confiança e transparência que escaparam ao anterior governo.