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Imagem de Quem são os pais desta democracia?

Quem são os pais desta democracia?

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Quem são os pais desta democracia?

A classe política cabo-verdiana não vive de ideologia ou objetivos de governação.

O seu propósito exclusivo é a captura do Estado a fim de dispor dos seus recursos. Essa batalha pelos recursos do Estado não se limita a recursos materiais.

É essencial vencer também a batalha pelos recursos simbólicos do país, nomeadamente a nossa consciência cívica e as nossas narrativas históricas.

O sucesso eleitoral depende da capacidade da classe política de controlar a nossa percepção da realidade do país, de nos fazer acreditar que há muito mais segurança quando não há, que a economia melhora quando não melhora e que os transportes estão muito melhores agora do que quando eram geridos pelo adversário.

Mas a batalha mais aguerrida é pela narrativa da nossa história recente, a que é travada entre o MPD e o PAICV pela autoria da independência e pela paternidade da democracia.
Já estamos acostumados a estas rixas que acontecem anualmente pelo 13 de janeiro, 20de janeiro e 5 de julho.
Contudo, há uma data menos conhecida, mas igualmente significativa, na disputa pela Autoria da Democracia Cabo-verdiana, 19 de fevereiro de 1990.

Há 35 anos, o governo do PAICV fez cair o quarto artigo da anterior Constituição que consagrava o PAICV como força política dirigente da sociedade e do Estado e abriu a políticacabo-verdiana à competição eleitoral.

Segundo a narrativa do MPD, Cabo Verde viveu sob a ditadura sanguinária do PAICV até ser salvo pelo novo partido.

Infelizmente, este só foi fundado em março de 1990, após a queda do quarto artigo e sem ter contribuído nada para o facto.

O que torna esta reivindicação de paternidade da democracia cabo-verdiana ainda mais falaciosa é a equivalência direta que o MPD estabelece entre abertura política e democracia.

O voto que para o MPD resuma a democracia é desprezado por grande parte dos eleitores, como atestam as nossas altíssimas taxas de abstenção.

Quanto à liberdade de expressão, outro ganho basilar do processo de democratização, a sua utilização é tragicamente deficiente devido à autocensura imposta pelo Estado em troca de acesso ao emprego e outras oportunidades.

Duas verdades precisam ser repostas, livres do interesse partidário de ambos os lados.

Primeiro, a democratização de Cabo Verde não se limita à participação política. Não começou em fevereiro de 1990 e muito menos em janeiro de 1991. Começou com a independência, com o alargamento acelerado do acesso à saúde, ensino e trabalho remunerado.

Segundo, a democracia cabo-verdiana ainda é um processo em construção, com vários marcos importantes, entre os quais o 19 de fevereiro de 1990.