Foi lançado no passado dia 07, o livro “Cabo Verde – Crise e Resiliência”, da autoria do primeiro-ministro, Ulisses Correia e Silva. A obra foi apresentada em Lisboa, e tem como subtítulo “Erupção vulcânica, secas, covid-19, guerras na Ucrânia e no Médio Oriente”,
Segundo o autor, o livro representa a resiliência do país – face a desafios como a erupção vulcânica de 2014; as “secas severas” de 2017 e 2021; a pandemia da covid-19; e os impactos das guerras na Ucrânia e no Médio Oriente.
É evidente que esta obra não nasceu da vontade de comunicar honestamente a experiência adquirida em 10 anos como chefe do Executivo e líder do MpD.
Ela nasceu antes do imperativo eleitoral – que as eleições próximas tornam iminente – de justificar o fracasso total da sua governação, frente às promessas de reforma económica e administrativa, que foram feitas pelas legislativas de 2016. Mas Correia e Silva não está sozinho.
Em 2015, José Maria Neves chegava ao final dos seus três mandatos como Primeiro-ministro. E os resultados da sua longa governação ficaram muito aquém dos compromissos assumidos com o eleitorado – nomeadamente, a promessa fantasiosa de crescimento a dois dígitos, que resultaria num boom de emprego qualificado.
É certo que este género de publicação já se tornou praxe entre líderes políticos pelo mundo afora; mas as obras surgem normalmente no final da carreira eleitoral, como preparação para uma transição.
Já aqui – agora e em 2015 – a motivação principal é claramente a continuidade da carreira eleitoral. Contudo, apesar das semelhanças de intenção, as posições respectivas de Neves e Silva são muito diferentes.
Neves governou por dois mandatos com relativa tranquilidade e boa aceitação popular. O fim do ciclo do PAICV só se fez sentir após a sua terceira vitória, quando já não pretendia uma quarta candidatura ao executivo.
Havia muito que Neves fazia cálculos com a Presidência da República. Portanto, era preciso justificar o seu desempenho no Executivo; e a publicação de um livro cumpria a função.
Neves acabou por decidir, sensatamente, não concorrer à presidência logo em 2016. Mas a erosão da sua imagem pessoal não foi tão drástica ou duradoura quanto a do seu partido; tanto que, na sequência de uma segunda derrota legislativa do PAICV em 2021, Neves venceu as presidenciais contra Carlos Veiga logo na primeira volta.
Contrariamente, o desgaste político do MpD começou pouco após a vitória de 2016; e em 2021, Ulisses Correia e Silva apenas arrancou um segundo mandato pela debilidade da Oposição. Em 2026, a sua candidatura forçada a um terceiro mandato ocorrerá num clima de tragédia anunciada.
Para além disso, à semelhança do que aconteceu com Carlos Veiga, uma eventual candidatura presidencial de Correia e Silva não parece ter grande viabilidade. Mesmo assim, há que tentar melhorar o terreno para as próximas legislativas.
Infelizmente, a publicação de uma narrativa que atribui o fracasso do seu governo a causas externas – apesar do que nós todos vimos ao longo de dez anos – é um recurso desesperado, que dificilmente terá impacto no resultado eleitoral.