Imagem de Os Devaneios do 8 de Março 

Os Devaneios do 8 de Março 

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Os Devaneios do 8 de Março 

Pelo 8 de março, Dia Internacional da Mulher, Cabo Verde é inundado com reportagens, publicações e celebrações da importância da mulher na sociedade. Infelizmente, a maioria desses conteúdos segue uma ideologia lamentável, completamente alienada da nossa realidade.  

Por exemplo: numa entrevista à Inforpress, Luísa Fortes, eleita municipal do Sal, afirma desafiar as supostas ondas da cultura patriarcal” que insistem em afogar” a voz feminina na política. 

Fortes partilhou com o jornal os desafios da sua jornada, dizendo que não esconde as cicatrizes da luta; e destaca a necessidade de mais mulheres no poder.  

Uma observação rápida da nossa atualidade política parece contrariar  esta ideia de mulher silenciada invocada por Fortes. Janine Lélis – deputada pelo MpD, vice-presidente do partido e destacada governante desde 2016 – é uma mulher do Sal  

Sara Lopes – deputada pelo PAICV, candidata municipal, e Ministra das Infra-estruturas no governo de José Maria Neves é outra mulher do Sal.  

O facto de uma população tão pequena ter contribuído com duas personalidades políticas tão destacadas sugere que as mulheres do Sal recebem o investimento das famílias; e que a sociedade do Sal confia plenamente na competência das suas lideranças femininas.  

Uma componente basilar do empoderamento feminino tradicional em cabo verde é a relevância económica histórica da mulher cabo-verdiana, inserida desde há muito no espaço económico e profissional. 

Mais uma vez, para que isso aconteça, é necessária uma condição fundamental: que as famílias invistam na educação e na mobilidade das suas filhas. O facto de isso acontecer transversalmente comprova a relevância tradicional da menina e da mulher na sociedade cabo-verdiana 

Ou seja, esta imagem de mulher vítima não deveria ser a que prevalece no país, particularmente numa ilha progressista como o Sal. 

Mas persiste, e prevalece por uma razão fundamental: há muito que o conceito de mulher vítima e silenciada é ativamente importado pela máquina pública Cabo-verdiana, com o intuito exclusivo de atrair ajuda externa ocidental, proveniente de doadores que adoram a ver ao espelho as suas narrativas sobre o género. 

A consequência trágica de décadas desta importação ideológica é que a narrativa de mulher desempoderada e violentada já foi completamente absorvida, a ponto de se ter autonomizado nas nossas crenças institucionais.  

É por isso que a eleita Luísa Fortes privilegia o papo de patriarcado agressivo: porque é essa a narrativa que as nossas instituições públicas – a comunicação social em particular –  estão condicionadas para promover.  

Sendo assim, é essa a imagem que muitas mulheres Cabo-verdianas em busca de palcos  politicos e institucionais optam por vender. No processo, distorcem sistematicamente a relevância da mulher na nossa sociedade; e apagam o seu papel histórico com devaneios importados sobre o género.